Mais uma música que já decorei e mesmo farta deixo tocar. O volume no máximo e de soslaio olha-me quem apenas sente um barulho estranho envolvendo o meu corpo.
A voz grita-me aos ouvidos, louca como pernas apressadas que se atropelam no metro, que se sufocam no comboio, para a contagem decrescente da fome, e o sono cronometrado.
A estação é um lugar de ninguém onde vibra a tentação de partir para lado nenhum. Mas fugir não é fácil. Logo mil cartazes perseguiriam a minha estrada.
No comboio vou só entre olhos apertados que trocam suores do dia esgotado. As janelas trazem a praia para dentro, frágil miragem de vidro. Os carris arrastando-me igual a cada minuto do dia anterior. Todos os dias o mesmo caminho, as mesmas paisagens, os passos de uma vida itinerada (perdi o mapa do tesouro). O mar vai e vem confuso, e é de tudo o que mais sou no mundo, calma sempre ameaçada por tempestade. À minha volta uma multidão de caras mudas e esquecidas, que não me vêem. E ainda bem. Sou o fim do que o egoísmo almeja. Desejo furioso de ser maior que tudo, de encontrar nos outros o amor que não me tenho.
O comboio até sabe ser confortável. Ao menos aqui, posso ser só mais um banco ocupado.

Comentários

Marta disse…
Há alturas em que me sinto cansada desse caminho quotidiano de passos entre comboios e corridas para apanhar um transporte. para 5 minutos. as vezes não me apetece nada. O que há em mim é um tremendo cansaço e uma vontade louca de sentir os lençois macios e a cama aconchegante. Quando todos os que nos cercam não têm muito para dizer ou acham que têm autoridade para nos dizer o que devemos ser, que beleza devemos ter e como devemos sentir... grr! mas viva a praia que vemos nos vidros viva o amor que vemos nas letras=)
Susana disse…
Há coisas que por vezes têm a capacidade de quebrar essa rotina e tornar mais confortavel cada viagem... Porque não chega sermos SÓ MAIS UM banco ocupado... **