Ficção

Forjaste uma identidade para ti. Enfiaste o corpo em carapaças para que ninguém te magoasse, à espera talvez que todos te amassem. Ficcionaste-te, tornaste-te um eu-história, eu-mentira que nunca foste. Tornaste-te vazio de ti, poço sem fundo da identidade perdida, mentira-verdade que agora nem tu sabes escrutinar.
Mas eu enredei-me nesse eu-fingimento que não eras tu, mas que tão veemente afirmavas ser, à cálida luz das sombras ficcionaste o amor, tornaste-o um objecto para absorver a luz, essa luz que indistintamente emanava de mim.Queres saber? Sugaste-me!Absorveste-me, inspiraste-me, porventura para tentar acabar com esse vazio em ti.
Contudo o vazio cresceu à medida que aumentaram as mentiras, nessa existência surrreal, e eu cada vez mais fraca e perdida a querer sair das tuas entranhas, mas sem forças. Não era amor, era abismo, os teus braços ainda........a crescerem.........cada vez maiores e eu a fugir em pés de cinderela. E os teus braços a crescerem na noite sem estrelas,estrelas consumidas neste amor sem ser amor, nesta voragem da despedida sem adeus. Não te amo, no entanto quero-te, preciso-te, incorporaste-me em ti, como se fosse carne na tua carne, irmã siamesa do teu corpo, como se não tivesse tido existência antes de ti. Fusão, Perfuração, invasão, quero-te porque não me deixas outra saída.
Conseguiste o que tanto ansiavas!Satisfeito?Esbofeteia-me nessas tuas carícias que me dilaceram a alma, não quero saber!És um mentiroso perfeito, um ilusionista, mago a tirar coelhos da cartola, tiraste-me também da tua cartola.Contente? A mentira é tão boa que já não consigo sair dela, cárcere onde vou morrer viva. Quero-te ainda, vem traz a tua boca-mentira e beija-me uma e outra vez, beijio a saber a licor, licor-veneno. Ficcionaste-te. Usaste-me.Ficionaste-me também. Moldaste-me.Agora só nos resta levar a farsa até ao fim.Um dia o pano há-de cair. O pano....... cair.......

Comentários

Anónimo disse…
mt bem ninfa ! igualmente talentosa tanto na poesia como na prosa !!! trabalhas muito bem com as palavras !! keep up :)
Fátima disse…
Surpreendes-me... soubeste levar a beleza da tua poesia a uma prosa sem comparação...

De facto, há quem nos domine com uma rapidez estonteante, confusa, até. Assim é o amor... inexplicavelmente belo...
Daniel Cardoso disse…
As criaturas que não têm luz própria muitas vezes vão buscá-la a outros lados, para conseguir sobreviver. E como usam máscaras, perdem-se (ou estão já perdidos) no meio da sua vida, da sua existência, no meio de todas as máscaras que tiram e põem. Só que essa luz não lhes aparece muitas vezes; embriagados quando isso lhes acontecem, tentam sorver tudo de uma vez, levando muitas vezes à extinção dessa mesma luz, à "incorporação".

Este texto toca-me muito. Parabéns.
Anónimo disse…
É tão bom sentir um texto mais em nós do que nas palavras que de facto s lêem... é como se o texto fosse uma porta por onde todos os sentimentos que traduzes querem passar, e que se acotovelam, sofrêgos... Gostei muito!!!
Anónimo disse…
OLA MARTA:)...É so pra dizer q o blog ta mt bom, o seu conteudo e de 1a categoria superior, voces os tres tao de parabens. Continuem assim, por favor:P...****
Anónimo disse…
É verdade...às vezes, as pessoas não passam de ficções, máscaras que teimam em se revelar… farsas que, no entanto, se seduzem a si e aos outros como o doce canto da sereia…Aquele que finge acredita no seu próprio labirinto de devaneios e mentiras...
Diz Pessoa que o fingimento é o fio de Ariadne para o auto-conhecimento…Talvez o poeta tenha razão, já que, cada vez que mergulhamos em nós próprios, somos forçados a fingir intelectualmente, ou seja, a fazer uso da nossa razão, razão essa que, no fundo, não é senão um meio de manipulação das emoções…elas sim estão arredadas da mentira…elas sim são verdadeiras e puras…
No meio disto tudo fica apenas uma certeza : Ninfa és perita em colocar no papel as tuas inquietações, os teus sonhos, os teus sentimentos…Isis e Terreno este elogio aplica-se também a vocês! Continuem !! :) “Sky is the limit”;)