Nada vezes nada


Posted by Picasa

Nada vezes nada é nada. Que é como quem diz zero vezes zero é zero na primária. A conta mais fácil e que nos fazia rir. E é isso que me sinto. A conta mais simples, mais banal, mais lógica e natural. Na naturalidade da sucessão dos dias e na rotina de frustrações e ambições perdidas como pegadas na areia apagadas pelo mar. Ou aquele andar pesado e arrastado na neve, suplantado ainda por um novo nevão. E se escrevo é porque sou como aquelas crianças que caem e se levantam sem chorar, sacudindo apenas o pó do chão. Eu já sacudi todo o pó que me fazia espirrar de arrependimento e saudade. Hoje só quero qualquer coisa que me devolva a certeza de ser, neste viver decorado entre tardes e noites. Que manhãs já não conheço. Pôr-do-sol de cores fortes que quer brilhar mais, e se esconde e desaparece entre as nuvens com medo. Esse medo que eu nunca admitir ter, penteando o longo cabelo e sentindo-me bem só porque se quiser posso sorrir. Sei-o desde pequenina. Move os lábios e os outros sentiram que estás bem, aprendi. Disfarço-me de mim e sou de novo. Inventando fotografias de sorrisos nas horas mortas. E os sorrisos não são de nada mais senão eu, sem mais nada nem ninguém, a certeza de estar, a certeza de continuar, apesar de tudo. Podem ser apenas sorrisos ao pé da minha cama entre os livros, sorrisos estirados no sofá, sorrisos na longa viagem de comboio, mas são sorrisos. Sorrio, e escrevo. "Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto. Faço férias das sensações", diria Fernando Pessoa, espelhando-me cruelmente nas suas palavras. Furiosamente escreveu-me como não gostaria de ter lido. E agora escrevo, para varrer a angústia para os dedos, para romper o paradoxo de sentir um não sentir devastador, com metáforas da emoção inebriante que se perdeu, procurando debaixo das palavras o coração escondido outrora entorpecido na sofreguidão de um beijo, a tela Arco-íSis no deslumbramento de um novo despertar. Sinto-me adormecida, mas escrevo. E sorrio.

(Às vezes, quando não sei quem sou, passo por estas letras, e encontro-me a espreitar entre as palavras.)

Comentários

Marta disse…
Acho qeu no fundo somos tudo, o que somos, o que não somos, o que jlgamso e não julgamos ser. somso o que está nas palavras mas as palavras não dizem nada de nós. Ficam paradas e estagnadas enquanto nós continuamos a mudar. Vivemos nesse mundo das letras, eu e tu, a tentar pôr toda a nossa vida nas palavras e nas suas entreinhas. Sinto essa necessidade de explicar e (re)explicar os sentimentos repetititavamente numa amálgama de palavras. Palavras essas que na tua caneta despontam em tons dourados, azuis e vermelhos. aquelas cores fortes e intensas.
Marta disse…
*repetitivamente
AR disse…
o que seria de nós sem estes dispositivos que adormecem as sensações e que nos despertam deste sono profundo?
:)*
Anónimo disse…
Gostei do texto, revi-me nele.
Os sorrisos que escondem tanta coisa que não sorrisos, como os conheço.. as frustrações refugiadas na escrita...
beijinhos
Anónimo disse…
eu senti...
AR disse…
n tens de agradecer!
tenho pena de n t ter apanhado depois da freq p t desejar boas férias!
fika bem!! i'll be back!
;)*
kiss
Alexx M. disse…
Lindo, lindo, lindo!!!!
Cm m revi nas tuas palavras, cm m imaginei sorrindo para que todos pensem que está tudo bem, para que eu pense que está tudo bem... O pior é quando vem aquela nostalgia de tempos melhores (vividos ou por viver), aquela sensação perdida ou nunca encontrada, aquelavontade de algo diferente... Eu sou eu. Mas acho que preciso de uma mudança...
Fátima disse…
somos muito mas às vezes é em coisas tão pequeninas como uma frase que nos revemos. é assustador como podemos ser tão resumidos! somos sol e grito de loucura, mas e no silêncio? somos também, mas adormecido. e é bom sabê-lo...