Consomes-te furiosamente
Escorregas torpe e fraca, entre o balançar confuso do teu corpo, desiquilibrado, ao ritmo do teu cantar embriagado. Os teus braços brincam na desarmonia de ti, palpando no ar um colo ou um olhar que te ampare. Balbuceias uma cacofonia linguística incompreensível, ris-te estupidamente sob os sobrolhos carregados de condenação e desprezo. "Eu estou bem, eu estou bem..." "Não, não estás!" Se calhar eles têm razão. Empanturras-te de prazer ilícito no teu transe psicotrópico. Ingeres compulsivamente chocolate e bolachas e molhas o chá de lágrimas. Tentas encher o que os teus complexos não te deixam tirar do mundo. A ridícula revolta do que és. A raiva das mãos amarradas por cordas invisíveis que confias a tudo menos aos outros para te libertar. Tens de parar. Tens de parar. TENS DE PARAR! Rompeste outra vez a tua almofada azul com o peso do teu pensar. O algodão solta-se à tua volta. Sopras o vento da teimosia mas o algodão cai-te no nariz e faz-te espirrar. Envolve-te insolentemente e ilumina-se com imagens desorganizadas de cada vez que disseste que estavas bem e mentias. A tua força hercúlea só brilha nos outros. Em ti és apenas o morder nervoso das peles das unhas, o mastigar furioso de pastilhas atrás de pastilhas, o pentear inútil do rebuliço do teu ondulado cabelo. E os teus risinhos nervosos. Estás sempre feliz. Sempre a sorrir. Anestesiada pelo incenso dos teus sonhos, ardentes de desejo mas desaparecendo em cinzas. Ilusões queimadas. Até do teclado desististe, e tocavas tão bem. Hoje tentaste tocar mas magoaste os dedos. Porque as notas estão zangadas contigo. Quiseste arranhar as teclas e pontepear as pernas, como se das tuas se tratassem. As tuas pernas disformes de pequenos pés e pequeno corpo em que apoias as pequenas quimeras de ti. Fechas os olhos e escreves com a violência de quem tem pressa de amar. E cantas baixinho serenando os soluços "let go, 'cause there's beauty in the breakdown"... Sacias-te de música e desamarras-te da cadeira e da despensa, porque lá fora pensa-se melhor. A lua ilumina-te melhor que a televisão.
"Drink up baby down
Hmm, are you in or are you out
Leave your things behind
'Cause it's all going off without you
Excuse me too busy
Writing your tragedy
These mishaps you bubble-wrap
When you've no idea what you're like
So let go
So let go
Jump in
Oh well what you waiting for
It's alright
'Cause there's beauty in the breakdown. (...)"
Let Go, Frou Frou (BSO do filme Garden State)
Comentários
Doce beijo
simplesmente fabulosa a descrição do sentir.
Adoreiiiiiii!
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