Tenho uma incrível capacidade de ficar profundamente triste de um momento para o outro. O pensamento mais fugaz e disparatado transforma-se rapidamente num mantra de auto-comiseração que não me abandona um dia, uma semana, um mês inteiro. Sempre fui assim. Olho para as minhas fotografias com cinco anos e admiro-me com o meu profundo e triste olhar. Naqueles olhos tão grandes, aquela criança parecia guardar a tristeza de todo o mundo. Por isso é que tudo o que escrevo é triste. Parece que só na tristeza é que chego ao mais fundo de mim, aquele Deus interior de que fala o hinduísmo. Dizem que esse Deus é de alegria, de paz, mas quando penso Nele não vejo nada de feliz. Estou sempre dez anos à minha frente, a tentar prever o futuro. É a minha missão aqui que me preocupa, pois parece-me muito estúpido que se exista só para pôr pão na mesa. Para hoje, amanhã ou depois. Que objectivo existe em comer, comer até morrer? Não me digam que não tenho uma missão, um propósito qualquer que justifique a minha vinda. Estou farta disto, dia após dia, a viver pelo 'pão nosso de cada dia'.
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