Dos amargos de boca da vida

Talvez fosse do livro que estava a ler, cheio de mulheres dramáticas, relações como pratos de porcelana prestes a partir, mortes trágicas e chocantes, mas naquele dia estava especialmente em baixo. Quem a visse, sorridente e animada, nunca imaginaria o turbilhão de emoções que confundiam os seus pensamentos enquanto tentava trabalhar.
Desde a morte do seu tio, levado inesperadamente, que percebeu que a vida tinha um especial prazer em dar amargos de boca a quem era guloso de alegrias, de momentos felizes e gargalhadas sonantes. Ainda assim, pensou que podia continuar a ter como certezas os pilares do seu dia a dia: o carinho e o companheirismo da sua família, em especial da sua irmã. Ao pensar nestas palavras o seu estômago dava voltas mas afinal vale mais admitir o que está a sentir, do que continuar a fingir que "está tudo bem". A verdade é que a pessoa que estava sempre disponível para os seus desabafos mais parvos, para as piadas mais secas e noites de miúdas, com muito chocolate, pipocas e filmes de animação a mistura (elas não eram de comédias românticas, mas mais de cinema com "bonecos") não estava nem aí para esses planos agora. Não tinham tido nenhuma daquelas discussões tontas de irmãos, eram apenas vicissitudes da vida. A irmã estava mais concentrada noutras coisas neste momento, outras prioridades. "Cenas da idade", pensou. No fundo, sem querer ela um dia também tinha deixado para trás algumas amigas por "cenas da idade", inconscientemente, mas a irmã... era diferente. A companheira de brincadeiras de infância e mais tarde de confidências de adolescente. Das inesquecíveis viagens de família, à bulha no carro, o pai a ameaçar que nos deixava à beira da nacional se não parássemos quietas lá atrás. Os almoços de família, as festas da aldeia, o amparo nos momentos difíceis, o luto pela avó, o avô e o tio. Memórias que, num dia mais sensível, lhe vinham à cabeça, teimosas, enquanto tentava escrever um texto que lhe tinham encomendado, sobre os benefícios da papaia. Fruta, sobremesas: a festa da aldeia em agosto (à qual agora nem sabia se a irmã também iria)... Pôs os phones, uma música animada, agarrou-se ao teclado e respirou fundo. A escrita era sempre terapêutica para ela. Mesmo quando é preciso escrever sobre papaia. Faz lá então a tua magia, escreve e esquece... Pelo menos até acabares essa página.

Comentários

Alexx M. disse…
Abraço apertado! Abraço forte!
Quero ler o tal texto sobre a papaia - que gosto muito eheh :)
E quanto a livros, estás proibida de ler Paula Hawkins! Já te vou fazer uma lista de sugestões eheheheh :)
Marta disse…
Acho que tens ler algo mais leve!!! E por falar em papaias, não era mau mandar uma papaia à cabeça de alguém que eu cá sei! Olha eu também te emprestei um livro leve, podes pegar nesse, que acho que ainda o tens em casa. E, já sabes, tens sempre outras «manas». E para cenas parvas, já sabes que estou aqui. Até porque somos as distraídas e desengonçadas do costume! =)
Mas maravilhosas!!!!!
Fátima disse…
Bem haja minha Xaninha!! Estou quase a acabar a Paula Hawkins mas isto só me deixa em baixo xD melhor não pegar mais nos livros dela. Bem haja querida :)
Fátima disse…
Uma papaia à cabeça de uma certa pessoa era bem feito xD acho que mesmo assim não chegava. Lol
Obrigada por teres dito que tenho mais manas.:) É verdade sim senhora <3