O verdadeiro significado das palavras

Medo. Não aquele dos papões, do escuro ou de fantasmas escondidos no roupeiro. Medo a sério. Ensinaste-me o que os dicionários nunca saberão dizer sobre o verdadeiro significado das palavras. És tão pequenina, quando adormeces no meu regaço, e os meus receios são tão grandes. Enchem a noite de demónios e de perguntas. Medo de te perder. Medo de não te conseguir proteger. 

Minha querida filha, enquanto te escrevo, deixa-me contar-te o que me ensinaste também sobre o amor. Cheira aos sorrisos que partilhamos a cada brincadeira, enquanto gesticulas e te maravilhas com as pequenas coisas do mundo. Tem a textura de uma música de embalar ou de uma valsa, em que rodopiamos sem parar. O amor sabe a nuvens fofas, a estrelas num céu límpido, e a tudo o que a nossa imaginação nos conseguir dar. Consigo sentir as cores deste nosso amor, numa mistura efervescente de tons cálidos. O meu amor acontece em perfeito estado de sinestesia. 

Porque talvez o amor chegue sempre em estado de confusão. Vira a nossa vida do avesso, liberta borboletas que não sabemos bem de onde vêm mas que se alojam na nossa barriga, e parece que o nosso estômago vive num constante estado de montanha-russa, para cima e para baixo. A paixão faz-nos rir e faz-nos chorar, numa catarse de emoções perdidas. O amor move-nos, conduz-nos, e leva-nos a tomar as atitudes mais irrefletidas e ridículas. 

O amor é uma aventura, e és tu que me guias com a tua mão pequenina. Abraças-me e derretes-me como um gelado deixado ao sol no verão, na mão de uma criança. E volto a trocar os sentidos todos, porque posso jurar que o teu abraço tem os cheiros da minha infância. 

Contigo regresso ao tempo em que também eu fui criança - talvez uma parte de mim ainda nem tenha crescido -perdida num mundo de faz-de-conta, com chás imaginários em chávenas vazias, bolos feitos de plasticina, e onde as respostas mais simples podem solucionar as questões mais complicadas da humanidade. 

Só ainda não sei resolver o medo. Nem compreendi a que cheira ou a que sabe. Talvez por se esconder em sítios muito escuros, cheire a mofo. Deve saber a torradas demasiado queimadas, que alguém esqueceu na torradeira. Mas o medo nunca nos deixa esquecer. É o reverso do amor e gosta de o perseguir como uma sombra.

Ensina-me a não ter medo querida filha, ensina-me mais sobre o amor. Deixa-me aprender contigo o verdadeiro significado das palavras.

Comentários

Fátima disse…
Tão lindo. Já tinha saudades de te ler ❤️ o amor que sentimos pelos nossos filhos é tão arrebatador que nos deixa com medo... Medo de perder algo tão forte!