Somos...

Somos orvalho ao amanhecer na boca do poeta. Às vezes rio que corre sem rumo para o mar. Somos espelhos baços cuja imagem reflectida é sempre o que querem de nós e nunca o que queremos ser.
Somos a mão estendida à espera do beijo terno que nunca vem, vagueamos por esquinas à procura da nossa sombra, sem reparar nas mil e uma outras sombras que nos rodeiam . Bradamos que estamos sozinhos, que o tempo não chega, que o dinheiro não chega.Magoamos, traímos, enganamos e à noite chegamos a casa, com os bolsos vazios e a consciência pesada. Às vezes somos o sonhador que atravessa as neblinas, o conquistador que se lança à aventura, mas nunca saímos das nossas quatro paredes. Noutros momentos somos solidários, talvez só para que os outros nos elogiem a nossa compaixão.
Na volta do mundo somos o caos, quando o nosso mundo está em ruínas, outras o riso partido em rios de lágrimas. Somos máscaras, somos ser, peça de teatro, jardim do Éden, lançamos raios de Vulcano, suspiramos nas esquinas.
Somos o bom e o mau, o lado podre e são da mesma maçã, somos homem, mulher, Adão, Eva. Somos nús, despidos, quandos nos lêm a alma, vestimo-nos porque dói muito a fragilidade. Incorporamos o mundo nos nossos gritos, somos estrela, luz, vela cuja chama ténue um dia se dissipará. Somos corpo, ficará de nós espírito? Quando os abutres cheirarem os nossos restos dilacerados e putrefactos?
Somos engano, vórtice, labirinto ou cartola de mágico, bola de cristal sem bússola, redundância, gesto ou palavra. Semente, que brota e se multiplica. Somos vento, miragem, oásis onde alguém repousa.Elixir, fénix, renascer, permanecer, almejamos. Existimos. Morremos. Sentido? Embrutecido? Ser. Perder. Ganhar. Que luta? Qual vida? A nossa. A minha. Ás de Copas. Cheque Mate. Golo. Fim. Confusão, dissertação. Aperto no peito, arrepio. Somos a criança à procura do colo brando onde repousar. Somos a mulher ou o homem sôfrego à procura de corpos para se fundir, se diluir, desintegrar e se voltar a refazer. Somos. Somos. Somos

Comentários

Fátima disse…
Sem dúvida. somos o que não esperamos ser e deixamos de ser o que somos. a inconstância do ser humano demonstra a sua singularidade. somos tanto porque vivemos numa catadupa de emoções e sensações das mais loucas situações. e mesmo confusos, mesmo arrependidos, reprimidos, magoados, desiludidos, enganados, ou quando todo o mundo parece ver-nos como criaturas estranhas e incompreensíveis, temos de ser, temos de viver, porque tudo nos ensina qualquer coisa. TUDO é importante e TUDO nos desenvolve enquanto pessoas, mesmo o que nos faz mal e crava espinhos no nosso coração. Porque no fim não somos perfeitos, não somos ideais, não somos sábios...mas vivemos e somos mais completos (embora nunca totalmente.)
*******ísis************