Tudo e Nada
Ajeitei as almofadas, e olhei para o relógio da mesinha-de-cabeceira. Eram 14:44. Tinha acabado de fazer a cama, apenas por teimosia da mãe, e ainda estava de pijama. Eu não posso dormir muito. Sinto-me ainda mais cansada do que quando durmo só quatro ou cinco horas, como se o corpo tivesse gostado tanto daquele intervalo de rebuliço que não mais quisesse despertar da onda em que vogava com tranquilidade. Naquela manhã nada nem ninguém me zumbiu aos ouvidos que não havia tempo nem sentimentos atrasados para ter de acordar de repente e como nos jogos repôr de repente a minha energia, o tubozinho verde suspenso e invisível no cimo da cabeça, quase sempre cheio, de verde vivo como a vontade de viver. Naquela noite tinha desligado o telemóvel, o computador, o despertador, fechei a porta à chave e dormi com a colcha por cima da cabeça, só com uma frestazinha para poder respirar. Precisava de me esconder. De tudo. De me proteger e de me sentir a mim mesma. Passei o resto da manhã quase muda, esquecida do mundo, com o ar condicionado no mais quente possível, e tão apática como os murchos olhos permitiam. Sabia que se ligasse o telemóvel teria uma ou duas mensagens dele, apaixonado, ansioso pela minha chegada, afinal tinha prometido vê-lo no dia seguinte... Mas não queria nem pensar nisso. Claro que o queria ver, mas... Que era esta necessidade toda de o abraçar? Tinha estado muito tempo sem ninguém, já me tinha desabituado. E porque sofria daquele desejo todo assim tão de repente? Seria carência? Se fosse, já a tinha saciado por outros corpos. Não, não é carência. Gosto mesmo dele. E isso é que me preocupa. Na mesma caixa de mensagens, caixa de saudades e vontades, estão as palavras loucas do outro, que cortando de repente todo o silêncio, tinha decidido recordar-me como se não houvesse mais ninguém, como se aqueles dois anos não tivessem passado sem termos sabido quase nada um do outro a não ser trivialidades, o estudo e o trabalho que sim, vão bem, e os teus pais, a minha irmã também, obrigado. Que queres tu agora? Estou bem sem ti, descobri um sabor novo que não existe nos iogurtes, nos gelados e nas bolachas, é diferente e é meu. Como tu há muitos pacotes, és chocolate clássico, amargo e tão normal que ninguém usa a não ser para os bolos. Ninguém te provaria com curiosidade. Até a tua cara é vulgar, na beleza dos teus vinte e um anos pareces um modelo que eu sempre disse que já tinha visto em qualquer lado, lembras-te? Ele não é parecido com mais ninguém.
Mas quero ver até onde consegues ir. Dizes que me queres ver agora, que és capaz de vir cá de propósito. Uma viagem, um dia inteiro longe de casa, entre o sotaque que sempre odiaste e a cidade que nunca compreendeste. Será que consegues? Será que após dois anos me vais tentar abraçar outra vez da mesma maneira? Foste o primeiro, no carinho, na emoção, no sorriso pelas palavras que nunca tinha ouvido, dirigidas a mim! Mas eram tão simples que não tinham o meu nome, juraste-as como quem canta uma música que soa bem, não custa repetir o amor quando se sabe a melodia que derrete os corações mais inocentes. Quem diz sempre e nunca com facilidade não ama, não tem medo. Tu viraste-me o rosto e repetiste a mesma música a outros olhos. Por isso não penses que agora viras a história ao contrário e começas do fim para o princípio como se eu não desse conta. Já li tantas histórias! E nenhuma pode começar do fim ou de palavras repetidas, eu não te vou ler. Já te sei de cor. Até demais!
E foi assim que às 15:55 estava vestida e pronta para sair, para o ver, um dia mais cedo, sem medos. Ele é o tudo e tu és o nada. Não vou deixar tudo por nada.
Mas quero ver até onde consegues ir. Dizes que me queres ver agora, que és capaz de vir cá de propósito. Uma viagem, um dia inteiro longe de casa, entre o sotaque que sempre odiaste e a cidade que nunca compreendeste. Será que consegues? Será que após dois anos me vais tentar abraçar outra vez da mesma maneira? Foste o primeiro, no carinho, na emoção, no sorriso pelas palavras que nunca tinha ouvido, dirigidas a mim! Mas eram tão simples que não tinham o meu nome, juraste-as como quem canta uma música que soa bem, não custa repetir o amor quando se sabe a melodia que derrete os corações mais inocentes. Quem diz sempre e nunca com facilidade não ama, não tem medo. Tu viraste-me o rosto e repetiste a mesma música a outros olhos. Por isso não penses que agora viras a história ao contrário e começas do fim para o princípio como se eu não desse conta. Já li tantas histórias! E nenhuma pode começar do fim ou de palavras repetidas, eu não te vou ler. Já te sei de cor. Até demais!
E foi assim que às 15:55 estava vestida e pronta para sair, para o ver, um dia mais cedo, sem medos. Ele é o tudo e tu és o nada. Não vou deixar tudo por nada.
Comentários
Fiquei sem palavras, olhando para o ecrã sem saber o que escrever. Que dizer depois de palavras tão intensas, tão puras, tão cheias de sentimento, tão verdadeiras??
Tudo na vida tem o seu tempo e a sua altura, é bem verdade. O tempo passa e por vezes espera por nós, outras não. E quando nós finalmente seguimos em frente, não esperamos que o passado nos persiga, venha atrás de nós com ideias de voltar ao princípio... porque nós já nem nos lembramos do princípio, porque só pensamos num novo princípio, aquele que nos deixa um friozinho no estômago, as pernas a tremer e um sorriso tonto nos lábios quando ficamos a olhar para o vazio recordando os pequenos detalhes que nos deixam tão felizes! Quando temos tudo, e tudo é novo e sabe bem, não vale a pena voltar atrás por nada...
Lindo como sempre, Faty, amei!!
amei o texto prendeu-me em cada palavra!
;)
beijão*
gosto do novo visual!
:)
é preciso estar fashion neh?!
ao menos na amizade tudo eh tao mais simples. surge, alimenta.se.. e vive.se.. aqui ta?